Há tempo que não ia à 'casa velha'. Quando estava a carregar uns baldes de lenha oiço um ganir de socorro. Vou até à voz, fininha de desespero, e pergunto o que se passa. «Não tenho força nas mãos, vizinho»; «isso pode ser da coluna, mostre-as lá», apalpei-as, toscas, quentes, e com sensibilidade. «eu sinto-as, mas não tenho força nelas para nada»; «não interessa, pode ser na mesma da coluna». A Maria, a mulher, mexe os lábios atrás dele: «é cancro». Ele desconfia e geme, «os médicos pensam que é daqui» e aponta para o abdómen. «Não é nada, nós temos dois tipos de nervos, um sensitivo e outro motor, e os nervos motores das mãos estão presos algures na coluna, comprimidos pelas vértebras». Vim todo caminho arrependido de lhe ter dito o que lhe disse depois. «Então, e se for uma coisa má, qual é o problema Djaquim?, não me diga que não é capaz de olhar para os seus 84 anos e reconhecer que viveu?».
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